De vergonha a hit nas passarelas, Burkina Faso redescobre o Koko Dunda, a ´chita` nacional

Antes, andar em “pagne” era sinal de pobreza. Tanto é assim que, em Burkina Faso, esse tecido -o mais barato do mercado, algo como tradicionalmente seria uma espécie de chita no Brasil- tinha apelidos muito pouco dignificantes, como “fácil de comprar” ou “meu marido está desempregado”. Mas bastou um estilista conseguir emplacá-lo nas passarelas locais para virar febre nacional e até mudar de nome: agora é Koko Dunda e veste de empresários a modelos, de artistas a políticos do país no oeste africano. Um deles é o presidente burquinense, Roch Marc Christian Kaboré.

“Para mim, o ´pagne` sempre fez parte da cultura africana e acho que essa é a nossa identidade. Eu sempre busco colocar um toque africano distinto a cada coleção que faço. E o Koko Dunda é um legado de nossos ancestrais e uma riqueza que temos”, afirma a Preta, Preto, Pretinhos o designer Sébastien Bazemo, mais conhecido como Bazem´Sé, que impulsionou a reinvenção do material e o transformou na Cinderela da moda local.

Koko Dunda alude ao lugar onde o tecido é produzido, “às portas de Koko”, na língua bambara. Koko é um bairro popular em Bobo Dioulasso, a segunda maior cidade do país, depois da capital, Uagadugu.

Sébastien Bazemo, estilista burquinense (Divulgação)

O “pagne”, um tipo de algodão barato tingido há gerações em Burkina Faso, é uma expressão da cultura local que vinha sendo sistematicamente substituída pela importação de roupas de segunda mão vindas da Europa e dos Estados Unidos. Por isso, Bazemo vê que ressignificar o tecido é um benefício que vai além da busca por novidades às vezes efêmeras e típicas do universo da moda. “Meu desejo é ver um dia todos -europeus, americanos, chineses- vestindo o Koko Dunda. É essa a luta que eu tenho e na qual acho que posso contribuir.”

O estilista conta que artesãs que produzem e tingem o tecido agora não dão vazão à demanda, e que é “um orgulho” ver mulheres que hoje podem sustentar suas famílias graças à revalorização de um saber antes desprestigiado.

Após um trabalho iniciado há três anos, em que começou a inserir o tecido em propostas para públicos influentes, Bazemo conseguiu dar-lhe exposição suficiente para imprimir novos sentidos ao imaginário popular do “pagne”: “Pessoas públicas, políticos, jornalistas, artistas internacionais estão usando a coleção e eu vendo muito bem as minhas peças aqui em Uagadugu. Gostaria de vender mais para o mercado internacional, especialmente online. Mas há um grande problema de conexão com a internet na África, e muitas vezes isso se torna bastante complicado”.

Modelo veste criação da marca Bazem´Sé, feita em Koko Dunda (Divulgação/Femba Images)