Contatos imediatos com o axé: ´Olhares Revelados`, no Museu Afro Brasil

A exposição “Olhares Revelados”, em cartaz no Museu Afro Brasil, em São Paulo, traz destacados fotógrafos brasileiros em séries sobre temáticas tão variadas como paisagens, mulheres quenianas ou rituais religiosos. Em comum, conta Silvio Pinhatti, fotógrafo, impressor e curador da proposta, os trabalhos propõem “revelar aos olhos do espectador do século 21, provavelmente exaurido do bombardeio de imagens sem sentido, o que há de único e especial no olhar de artistas-fotógrafos que continuam zelando por essa arte”.

Uma delas é Andrea Fiamenghi, que apresenta imagens das festas e cerimônias de culto do terreiro Ilê Axé Opô Aganju, em Lauro de Freitas, na Bahia. A fotógrafa vem acompanhando momentos do cotidiano dessa comunidade há 15 anos. Dos milhares de registros acumulados, escolheu 15 para essa exposição. Ao lado das obras de Andrea, compõem “Olhares Revelados” fotografias de Eidi Feldon, Gil Renó, Lucila de Ávila Castilho, Paulo Behar, Pedro Sampaio e Tuca Reines.

Ela conta como começou essa aproximação com o universo ritual do candomblé: “Recebi o convite de Pai Balbino de Paula, Obaràyí D’Xangô, em uma das minhas visitas à casa, que aconteceu após um sonho com ele”. O babalorixá a convidou, então – e depois de receber autorização dos orixás-, a fotografar uma das celebrações centrais do calendário dessa religião, as Águas de Oxalá: “Uma festa muito restrita, pacífica e belíssima”, descreve Andrea.

Festa de Oxalá (2018). Foto: Andrea Fiamenghi

Esse mergulho se intensificou com novas permissões recebidas de Balbino, mas, especialmente, das divindades, no contexto da liturgia do candomblé. “Recentemente, na festa de Yemanjá, estava fotografando e de repente Yemanjá veio em minha direção e me ´suspendeu`, me conduziu pelo barracão, e fui saudada por todos os orixás. Foi uma imensa surpresa e também um grande presente de reconhecimento”, ela conta.

Ter o privilégio de não só observar como retratar momentos de recolhimento e transe de integrantes da casa -algo concedido a eleitos – é visto pela fotógrafa como uma oportunidade de, além de compartilhar instantes de devoção máxima em uma tradição de séculos, exercer “uma função social”: “Espero que minhas fotografias possam mudar a visão estigmatizada, de alguns setores sociais, em relação ao candomblé, o que revela, sobretudo, grande preconceito racial”.

E o grande desafio, ela reflexiona, é poder eternizar e transmitir parte do encanto que surge no terreiro e que se consolida no dia a dia. “Gostaria que os visitantes vivenciassem um pouco do axé que os orixás têm. Eles são forças e energias da natureza. Meu principal objetivo, através da arte, é este: conduzir o espectador à fruição de um espetáculo da natureza manifestado em uma matéria humana, em um ritual extremamente protocolar e sofisticado, repleto de fé, magia e beleza plástica. O candomblé possui um papel social de extrema importância à medida que edifica nos iniciados, sobretudo nas crianças desde cedo, referências positivas de ordem, disciplina, obediência, reconhecimento, respeito, resiliência, força.”

Olhares Revelados
De terça a domingo, de 10h a 17h
Museu Afro Brasil (parque Ibirapuera, portão 10); entrada grátis