‘Você não pode representar os negros se não os contratar’, diz Sinqua Walls, estrela do BET, canal que chega ao Brasil
“Nossas histórias são valiosas, são rentáveis e cativam.” Assim resume Sinqua Walls – ator protagonista de “American Soul”, uma das séries que marcam a aterrissagem da BET (Black Entertainment Television) no Brasil – o admirável mundo novo das propostas de entretenimento com temáticas e protagonistas negros: a tônica do canal norte-americano, que também exibe conteúdo noticioso.
Na série, Walls é Don Cornelius, apresentador de TV, criador do programa “Soul Train” e eixo central da narrativa. Assim como o personagem, o ator afirma – em entrevista exclusiva a Preta, Preto, Pretinhos – que “crer em si mesmo” foi o ingrediente determinante para que pudesse viver da profissão. “Estou grato pelo fato de existir uma plataforma que crie espaço para contar esse tipo de histórias. Se não houvesse um Don Cornelius, não haveria um Sinqua ou outras pessoas, porque esses pioneiros tiveram que forçar a abertura dessas portas para que nós pudéssemos passar.”
Sobre a chegada da marca ao Brasil, com sua população majoritariamente negra, Walls diz estar entusiasmado e conta que tentou conhecer o país várias vezes – a última foi no ano passado, quando foi impedido pela pandemia. “Espero que os brasileiros, ao nos assistir, possam rir, chorar, se divertir e sentir que todos nós, coletivamente, temos paixão na tarefa de chegar às pessoas e contar histórias.” O BET está disponível gratuitamente pela Pluto TV Brasil, com conteúdo dublado em português.
Para além da expansão empresarial do canal, Walls aponta para uma ampliação dos pontos de contato na diáspora. “O nível de alcance da cultura negra é extraordinário. A história dos negros, no mundo inteiro, gerou uma enorme influência sem importar de onde eles vêm”, observa. “E que o BET esteja presente no Brasil, um país que tem uma influência musical, cultural, de moda tão grande, faz todo o sentido para mim. Quer dizer que a marca está se expandindo, mas que todos nós, como negros, também estamos nos expandindo para vários territórios, e de forma mais evidente.”
Dar oportunidades não só para atores, mas para todos os profissionais negros da indústria do audiovisual é “justamente a história do BET, que queria ser um espaço para representar as pessoas”, comenta. “E você não pode representar essas pessoas se não as contratar. Vejo que no canal sempre há a preocupação de contratar talentos negros, não só à frente das câmeras, como é meu caso, mas em muitos outros departamentos.”
Sobre a administração Biden e as expectativas de mudanças nas relações raciais nos EUA, o ator diz que ainda é preciso “um pouco mais de tempo” para avaliar a nova gestão: “Em um governo de quatro anos em geral você provavelmente não vê os impactos reais até o último ano. Podemos ouvir ótimas frases políticas, mas no final das contas você não vê o que está sendo feito de verdade para o povo até o final do período”.
Ele se mostra mais incisivo quanto à crença em transformações geradas pelos coletivos sociais: “São tempos sem precedentes para a nossa cultura, com o movimento Black Lives Matter e sua eclosão global. De muitas formas, acho que estamos dando pequenos passos para a frente”, analisa. “Porque é impossível não ver a dualidade que temos, em todos os aspectos e seja como afro-americanos ou afro-brasileiros. Todo esse movimento vai impulsionar mudanças para o futuro. O racismo já não é uma pergunta, é o que é.”